Quem não sonha em ficar milionário com criptomoedas? Mas se isso acontecesse e você for residente fiscalmente na Italia, você sabe como funciona o pagamento de impostos na Italia em relação a criptomoedas?
Não é fácil entender como as coisas funcionam na Italia porque as leis italianas são confusas, uma instituição pode contradizer outra e nem os especialistas no assunto chegaram a uma única conclusão. Mas você veio aqui para ter respostas e a melhor resposta que encontrei até agora foi publicada em um artigo no jornal italiano Il Sole 24 Ore, que tomei a liberdade de traduzir para o português.
O artigo foi escrito por Stefano Capaccioli, contador e fundador da Coinlex, empresa de consultoria e rede de profissionais especializados em criptomoedas e soluções blockchain, presidente da Assob.it, autor de “Criptoattività, criptovalute e bitcoin”. Ou seja, o cara entende do assunto. Então leia abaixo o que ele escreveu:
Criptomoedas e impostos na Italia na visão de Capaccioli

As criptomoedas são moedas estrangeiras: assim declarou a Agenzia dell’Entrate.
Está escrito na Risoluzione 72/E del 2016, promovida por muitos, talvez gente demais, como se fosse o Oráculo da Verdade, quase um dogma, uma verdade inquestionável.
É assim porque é assim.
Esse atalho conceitual agora faz parte da bagagem cultural de profissionais que parecem ter desligado o cérebro.
Vamos tentar ir contra a maré.
As criptomoedas e moedas virtuais em geral podem ser moedas?
O Banco Central Europeu diz que não!
A Direttiva (UE) 843/2018 define que as moedas virtuais “não têm o status legal de moeda ou dinheiro”.
A Direttiva (UE) 713/2019 confirma que as moedas virtuais “não têm o estatuto jurídico de dinheiro ou moeda”.
E não pára por aí.
O Testo Unico Valutario define como moedas estrangeiras apenas “notas de bancos e governos estrangeiros com curso legal” (art. 2 del DPR del 31.03.1988 n. 148).
Nada.
Tais reflexões são ignoradas em meio a tanto barulho: continuamos a ler, insistentemente, que as moedas virtuais e as criptomoedas são moedas estrangeiras… como esclareceu a Agenzia delle Entrate…
A gente começa a pensar que quem continua a difundir esta mensagem não quer nem escutar, resistindo a qualquer evidência e polarizado na sua própria opinião, que depois levou a argumentar que um wallet (carteira de criptomoedas) pode ser equiparado a uma conta corrente / depósito, em total contraste com a evidência dos fatos, as definições ISO e la Direttiva (UE) 843/2018.
Essa persistência em um erro claro pode responder a um duplo requisito:
- Não querer admitir o erro interpretativo cometido, quase como se a Receita tivesse o dogma da infalibilidade.
- Atrair para a tributação essas novas formas de “capacidade tributável”.
Enquanto no primeiro caso não podemos objetar, no segundo caso as criptomoedas são equiparadas a moedas estrangeiras para tornar os ganhos de capital tributável (rendere imponibili le plusvalenze, em italiano). Isso mesmo se a Corte Costituzionale destaca a necessidade de categorias específicas.
Sem querer entrar em questões jurídicas, visto que a parte emocional é mais importante do que a racional, é preciso demonstrar que, como a lei é lógica, quando se comete um erro, as consequências tornam-se grotescas.
Nós também seguimos a tendência, conforme “esclarecido” pela Receita: criptomoedas são moedas estrangeiras e a carteira é conta-corrente.
Neste caso as normas aplicáveis estão portanto nos art. 67 e 68 del T.U.I.R, e em específico:
Art. 67 del T.U.I.R. comma 1: le plusvalenze (…), realizzate mediante cessione a titolo oneroso ovvero rimborso (…), di valute estere, oggetto di cessione a termine o rivenienti da depositi o conti correnti (…). Agli effetti dell’applicazione della presente lettera si considera cessione a titolo oneroso anche il prelievo delle valute estere dal deposito o conto corrente;
Art. 67 del T.U.I.R. comma 1 ter: “1-ter. Le plusvalenze derivanti dalla cessione a titolo oneroso di valute estere rivenienti da depositi e conti correnti concorrono a formare il reddito a condizione che nel periodo d’imposta la giacenza dei depositi e conti correnti complessivamente intrattenuti dal contribuente, calcolata secondo il cambio vigente all’inizio del periodo di riferimento sia superiore a cento milioni di lire per almeno sette giorni lavorativi continui.
Art. 68 del T.U.I.R. comma 7: c) per le valute estere prelevate da depositi e conti correnti si assume come corrispettivo il valore normale della valuta alla data di effettuazione del prelievo;
Para evitar a diatribe sobre a ausência de mercados regulamentados e consequentemente a falta de qualquer preço, tomemos dois exemplos com preços no Coinmarketcap em USD.
Ano 2017
A criptomoeda VERGE (XVG), no dia 1 de janeiro de 2017, valia 0,00002825407 com a consequência que a detenção de 1.827.902.320 XVG não ultrapassava o limite de € 51.645,68 para todo o ano.
No dia 23.12.2017 o VERGE (XVG) atingiu o preço de euro 0,253970936 com um lucro sobre este montante superior a € 464.200.000, fora de qualquer tributação por não ultrapassar o limite referido no parágrafo 1-ter!
Ano 2018
A criptomoedas RAIBLOCKS (XRB), agora NANO foi lançada em outubro de 2015, com atribuição gratuita de criptomoeda até 2017, com a primeira cotação de USD 0,009104. Em 1º de janeiro de 2018 a cotação máxima diária foi de Euro 24,25, com máximo atingido no dia seguinte o preço de 30,84 EUR.
No caso de um contribuinte com 100.000 XRB (valor de 910 dólares em 2017) doados no dia 02 de janeiro de 2018 pela plataforma Bitgrail contra bitcoin e mantidos em tal plataforma (forçosamente devido à impossibilidade de retirada, uma vez que a plataforma foi então declarada falida em 21 de janeiro de 2019), a situação seria a seguinte:

O saque do wallet do dia 2 de janeiro de 2018 tem o valor normal de 3.084.000 euros, sujeito a tributação uma vez que a posse subsequente dos 250 bitcoins faz com que seja ultrapassado o limite de 51.645,69 euros.
A plusvalenza gera assim uma dívida tributária de € 978.120,00, sem que o contribuinte tivesse a disponibilidade nem mesmo dos bitcoins ou de qualquer valor equivalente, pois poderia rastejar para o valor da data da falência, por um montante inferior!
Objetivamente, estes dois casos, que estão longe de ser modelos, mostram a absoluta ilogicidade da interpretação da Receita.
Mas, pensando bem, nem mesmo a Risoluzione 72/E del 2016 diz expressamente o seguinte: “No que diz respeito à tributação para fins de imposto de renda dos clientes da Empresa, pessoas físicas que detêm bitcoins fora da atividade empresarial, observe que as transações à vista (compras e vendas) de moeda não geram lucro tributável por falta de finalidade especulativa. “
Além disso, nem a própria Agenzia delle Entrate acredita na assimilação às moedas estrangeiras, visto que para fins de monitoramento fiscal (quadro RW) as moedas virtuais são equiparadas a “outros ativos financeiros estrangeiros”, de forma que nenhuma regra sobre moedas estrangeiras se aplica neste caso, obrigando a declarar também os detidos através de operadores italianos!
Fim da história triste.
Atualização 29/11/2021
Quem segue Capaccioli no Linkedin deve ter visto o novo post dele sobre o novo D.Lgs. n. 184 del 8 novembre 2021 publicado na Gazzetta Ufficiale de 29/11/2021. O novo decreto atua a diretiva UE 2019/713 relativa a luta contra as fraudes e as falsificações de meios de pagamento diferentes do papel.
O artigo 1 oferece a definição das moedas virtuais:
1. Agli effetti della legge penale si intende per:
d) «valuta virtuale» una rappresentazione di valore digitale che non e’ emessa o garantita da una banca centrale o da un ente pubblico, non e’ legata necessariamente a una valuta legalmente istituita e non possiede lo status giuridico di valuta o denaro, ma e’ accettata da persone fisiche o giuridiche come mezzo di scambio, e che puo’ essere trasferita, memorizzata e scambiata elettronicamente.
Capaccioli comenta: “Quer dizer que as moedas virtuais não possuem o status jurídico de moeda conforme as definições europeias? Por quanto tempo a Agenzia delle Entrate continuará com uma definição contrária à lei?”
Abaixo o post origianl de Capaccioli:
Se gostou do testo siga o autor no twitter: @s_capaccioli



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